Analista: presente! Tal frase surgiu a Romildo do Rêgo Barros como um sopro, num instante. Pareceu-lhe poético, estético, um grão a perseguir. Ao me convidar para coordenar a Comissão Científica, disse: “Já tenho o título e se escreve assim: Analista dois-pontos presente ponto de exclamação”. Um título para ser lido: da fala ao escrito. E acrescentou: “É só isto o que tenho. Temos pela frente a tarefa de desdobrá-lo e extrair dele algum ensino”.

Sobre o “desdobrar”, Romildo escreveu:

“O analista, como a mulher, é desdobrável, e isto tem consequências. A primeira delas é que ele, assim como ocorre quando recebe uma demanda de análise, não sabe de antemão o que vai acontecer, e menos ainda quando lança mão do seu computador ou do seu telefone, suplementares do antigo setting […].

Só o tempo dirá com maior clareza os efeitos e o sentido desse acréscimo e desse gesto inédito […]. Uma coisa pelo menos é certa: após essa experiência, nós nos tornamos sem dúvida mais sensíveis à contingência, longe do dogmatismo […]”[2].

No desdobrar, uma aposta na abertura ao indeterminado, na contingência que fura o dogmatismo por um gesto inédito. Punctum!, nome do nosso boletim on-line! Nosso encontro acontece no instante punctum da história da psicanálise, quando em resposta à pandemia, a experiência de uma prática on-line aconteceu de forma inédita. “Analista: presente!” faz par com esta novidade, e, como disse Christiane Alberti, “não para denegri-la ou celebrá-la, mas tomando-a como um vetor de nossa investigação”[3].

Ao cair na rede, o “Analista: presente!” logo se desdobrou, dirigindo-se a um S2: “presença do analista”. Mas haveria uma identidade entre os termos? Para Laura Rubião, “Analista: presente!” “transmite, necessariamente, por sua escrita singular, um curioso enodamento entre o que se diz e o que se escreve. Dois pontos, pausa, detenção. Na sequência, o que se enuncia sob o modo exclamativo – presente! – […]”[4].

 

Entre dois pontos

Dois-pontos é um elemento linguístico sem sentido, assemântico, que se intromete entre o analista e o presente. Esse elemento tem um valor de pausa, e eu acrescentaria que instala entre o semântico e o assemântico uma conjunção indeterminada. Entre o analista e o presente não há uma conexão lógica direta, requer-se uma passagem. Sem os dois-pontos e a exclamação, “analista presente” é só um sintagma onde um substantivo se liga ao adjetivo, estabelecendo uma identidade entre os termos: S1-S2.

Mas, pausa lá! Tem dois-pontos no meio do caminho.

Graças a um cochicho de Flávia Cêra, pude ler alhures, em Giorgio Agamben, que o sinal de dois-pontos, numa frase, “[…] inclui também a ‘não-relação’ ou a relação que deriva da não-relação […]”[5]. Ele retoma a metáfora de Adorno, que evoca os dois-pontos como o sinal verde no trânsito da linguagem, bem como os tratados sobre a pontuação, onde se lê que os dois-pontos também ali são classificados “entre os sinais que abrem”[6]. Então, seguindo essa trilha aberta por Agamben, talvez seja possível dizer que também entre Analista e presente haja “uma espécie de passagem sem distância e identificação – algo como uma passagem sem mudança espacial”[7]. Presumo que esse sinal assemântico abre a outra dizmensão (ditmension[8]), tal como escreveu Lacan.  “Que na pontuação esteja presente um elemento assintático e, mais em geral, assemântico, está implícito na conexão constante, com o respiro […] e que age necessariamente como uma interrupção do sentido […] indica onde se deve respirar”[9].

A poética do título assim se desdobra. Sigo com Éric Laurent: Se “Lacan evoca a insistência da carta poética em infringir as regularidades sintáticas”, é porque “há na letra uma insistência de violação. O que interessa a Lacan é a escrita poética como ilha de efração, de irregularidade”[10]. Uma pausa para respirar, corte que abre passagem a uma outra dizmensão, indeterminada, mas que pode acontecer – a poética do título se mostra então como um achado e um tropeço, suporte e vertigem da causa que desagua numa experiência de análise e em cada época.

Falar do argumento e dos eixos de nosso trabalho foi a tarefa que a coordenação do Encontro me incumbiu, hoje, mas me vi num impasse: como apresentar o argumento, uma vez que ele já caiu nas redes? Mesmo que muitos ainda não o tenham lido, como apresentar o mesmo de uma outra maneira?

Ouvi[11] sobre uma conferência onde Esthela Solano contava sua análise com Lacan e fui dormir. O título da Ornicar? especial: Lacan Redivivus! me despertou e eu, nele, ouvia: Lacan: presente! Uma edição fora de série, “sem exegeses eruditas da doutrina, um livro dedicado a torná-lo vivo”[12]. Folheei esse objeto precioso. Li o que ali escreveram aqueles que se analisaram com Lacan, o efeito de real do encontro com um analista: presente!

O frescor do redivivus se fez presente, e eu o segui…

 

Entre a eternidade e o instante

Chama a atenção como nos testemunhos dos analisantes de Lacan, o analista, em ato, corta a rotina como um objeto sonante, perturbador, acolhedor, nunca o mesmo, no par e passo da pulsação temporal que escande o dizer. A presença do gesto, da modulação da voz, seu tom, sua ternura, sua cólera, seu cinismo, seu silêncio participam do tecido de um laço a dois e, mais ainda, de uma subversão. Lemos em cada relato dos analisantes um Lacan diferente, presente em cada um como em nenhum outro, o que ilustra muito bem que, no discurso analítico, “só se trata disto, do que se lê e tomando como o que se lê para além do que vocês incitaram o sujeito a dizer”[13]. O que nos leva a investigar o estatuto do inconsciente e da interpretação na atualidade na clínica.

De Freud a Lacan, onde estamos?

Para Freud, o inconsciente é uma cidade eterna. E o analista, na analogia freudiana, se aproximaria do arqueólogo em sua função de escavar os escombros[14] e interpretar seus resíduos para ler os capítulos apagados da história, devolvendo-lhe um lugar na rede dos sentidos. Mas, tomada no giro da dinâmica da transferência, a presença do analista pode vir a surgir como um obstáculo, fechando a porta do inconsciente.

Lacan, em 1953, lê essa dificuldade apontada por Freud assim: “No momento em que ele [o paciente] parece pronto para formular alguma coisa de mais autêntico, de mais quente do que jamais pôde atingir até então, o sujeito, em certos casos, se interrompe e emite um enunciado que pode ser este: Eu realizo de repente o fato da sua presença[15]. Ou seja, antes da porta se fechar, algo ali irrompe e se precipita na presença do analista. Aproximação e tropeço! Lacan segue perseguindo esse impossível de apreender que a presença do analista evoca, construindo formas para sondá-lo e dele se servir na direção da clínica.

Em “Posição do inconsciente” (1960), Lacan diz que o analista faz “parte do conceito do inconsciente, posto que constitui seu destinatário” e que ele só sustentaria a presença do inconsciente ao “experimentar-se sujeitado à fenda do significante”[16]. Ou seja, a parte destinada ao analista no inconsciente é a que se abisma na fenda do Outro, no furo do significante, uma formulação que parece auspiciar o S de Ⱥ. Em 1964, em uma aula cujo título é a “presença do analista”, nome de um livro[17] fortemente criticado por Lacan, este diz que a expressão presença do analista era muito bela e seria um erro reduzi-la “a essa espécie de pregação lacrimejante, a essa intumescência cerosa, a essa carícia um pouco viscosa…” e afirma em seguida: “a presença do analista é ela própria uma manifestação do inconsciente”[18]. Lilia Mahjoub nos abre o alcance de tal bela expressão:

“[…] as sessões com ele não eram verdadeiramente curtas. Durante estas, ele se levantava, vinha me olhar enquanto eu estava deitada no divã, sorria para mim. Eu queria desaparecer. Eu fechava os olhos como o fazem as crianças que querem se esconder.[19]

É o início do verão, está fazendo muito calor naquele lugar habitualmente fresco que é o 5, rue de Lille. Glória me avisa que posso ir ao escritório de Lacan onde ele me espera. Aninhado em sua poltrona, atrás do divã, ele gesticula para que eu me deite com um ‘Ah, querida, venha’. Acho seus trajes um tanto negligenciados, sua camisa aberta deixando aparecer sua barriga. Fico em silêncio este dia. Ele também. Na sessão seguinte, digo a ele: ‘A última vez, o senhor tinha a sua camisa aberta’. E ele me solta em tom suave: ‘O que eu tinha de aberto?’”[20].

 

Interpretação que descortina o que em si insistia como olhar na cena de sua fantasia. Esta vinheta esclarece que o inconsciente que se abre ali, por um instante, já não é mais o freudiano, e sim aquele que acontece lá onde o analista é sujeitado à fenda que abre… e Lacan fará um percurso até o final do seu ensino para o bem dizer. Ele parece estar no seu encalço.

Ainda, no Seminário 11, ele dirá ser justo o bom senso – aquele do sentido, “que fecha a porta, ou a janela, ou o postigo”, do inconsciente. E “a bela com quem queremos falar está lá detrás”, pedindo para reabrir os postigos. “E por isso mesmo [diz Lacan] que é neste momento que a interpretação se torna decisiva, pois é à bela que temos que nos dirigir”. Para ele, o inconsciente, que se trata de realizar, “ele não está do lado de lá do fechamento, ele está do lado de fora. É ele que, pela boca do analista, apela à reabertura do postigo”. A bela lá fora, surge na boca do analista… se intromete nesta fenda. Impossível de apreender, ela está sempre lá, presente, “em toda abertura, por mais fugidia que seja, do inconsciente”[21].

Se, “no primeiro ensino de Lacan, a interpretação tinha como efeito dar acesso aos capítulos apagados da história, ao que ali estava escrito”, nos escombros da cidade eterna, Lacan segue em seu ensino e “se livra dessa referência à história”[22] lacrimejante, cerosa, viscosa da associação sem fim, através da interpretação que se dirige à bela que passa e não se deixa capturar pela rede dos sentidos.

Esthela Solano conta em seu livro Três segundos com Lacan que, antes de ir ver Lacan, fez uma análise em que as sessões duravam 45 minutos. Ali ela falava, fumava e chorava o tempo todo. Com Lacan, suas sessões eram curtíssimas e as interpretações sem nenhum sentido. Ela não entendia nada, mas furavam a couraça de sentido que tecera na análise anterior. Um dia, ele corta o que ela estava a dizer numa sessão que dura exatos três segundos. Ao atravessar o pátio, ouve o equívoco que o corte evidenciava, e ela ri pela primeira vez, depois de tanto chorar. Para que gastar 45 minutos para chorar quando bastam três segundos para sorrir? O corte desprega o S2 do S1, algo do gozo se libera desse Um que se lê, agora, de outra maneira e a faz sorrir. Tal como precisa Miller, “é preciso que haja um limite ao monólogo autista do gozo. […] – A interpretação analítica faz limite[23]. O analista aí presente é o corte que rompe “na contramão do princípio do prazer […] introduz o impossível”[24]. Uma vinheta que mostra que cada sessão é única e instala o tempo como analista[25], a perfurar o inconsciente repetição para dar lugar ao fulgor do inconsciente intérprete. Esthela Solano seguiu sua análise numa outra posição, sem choro, e os cortes rápidos continuariam até o final.

“A questão não é saber se a sessão é longa ou curta, silenciosa ou falante. Ou a sessão é uma unidade semântica, aquela em que S2 vem pontuar a elaboração – delírio a serviço do Nome-do-Pai, muitas sessões são assim, ou então a sessão analítica é uma unidade assemântica, reconduzindo o sujeito à opacidade de seu gozo. Isso supõe que, antes de ser concluída, ela seja cortada”[26].

No caso de Esthela Solano e Lilia Mahjoub, o analista perturba a defesa, perfura sua ficção numa ajuda-contra para fazer percutir a moterialité[27] que faz vibrar o real no dizer. Uma aposta na potência de subversão. Dito de outro modo, o “analisante fala, o analista corta. Não é mais a palavra que faz a coisa, mas o corte que tem o poder de mudar a estrutura das coisas”[28]. O real que não é o mundo, uma vez que “não há nenhuma esperança de alcançar o real pela representação”[29] e o simbólico só pode mentir. Então, só temos o corpo como suporte, não há outro, para vibrar e repercutir o que é da existência. Lacan explora os recursos que permitem ao analista alçar a fenda e fazer vibrar o furo em S de Ⱥ, pois “o forçamento é por onde um psicanalista pode fazer soar outra coisa que não o sentido”[30]:

“[…] depois de longos anos e no meio de desavenças fantasmáticas variadas, eu estaciono um dia meu carro […] em um quarteirão da rue de Lille. Eu abro minha porta e um outro carro adentra no meu. […] eu me precipito à sessão para fazer uma descrição exaltada do acontecimento. Eu o lia como um ato falho que poderia ter tido uma incidência catastrófica. Eu vibrava com as ressonâncias do que poderia ter acontecido. E então, [Lacan] soltou um ‘em suma, isso aí não tem nenhuma importância’. Esta interpretação soou como um: ‘c’est fini’. Era o tempo de despertar dos encantamentos da leitura de todos esses signos. Eu estava confrontado com uma outra espécie de buraco, uma espécie de travessia do deserto, até a saída final”[31].

Éric Laurent evoca o instante em que o falasser se depara com o seu exílio da relação que não existe. “Quando atingimos esse ponto, essa ausência do eu (moi)” é onde algo de novo acontece. Lacan sustenta que só aí “estamos no registro do discurso analítico”[32]. Ele verifica a fenda, onde a barra tomba sobre o A, o que instala uma passagem a uma outra dizmensão: da fala ao escrito. Pois, “tudo o que é escrito parte do fato de que será para sempre impossível escrever como tal a relação sexual”[33]. É a este impossível que a interpretação se dirige, a bela com quem se quer conversar. E o que por esta via se abre “não tem a ver com os ouvidos, mas somente com a leitura, com a leitura do que se ouve”[34], pois se o inconsciente é o que se lê, “o que há de mais próximo daquilo que nós analistas, graças ao discurso analítico, temos de ler – é o lapso”[35]. Isso nos abre à problemática da interpretação corte, assemântica e apofântica[36], quando se alcança uma outra dizmensão:

“Em uma sessão, digo: ‘Acordo todas as manhãs às 5 horas. É a hora em que a Gestapo vem procurar os judeus em suas casas…’ Lacan se levanta, se precipita até mim e acaricia minha bochecha esquerda. E corta a sessão. Num primeiro tempo, fiquei siderada, emocionada. Num segundo tempo, decompus a palavra: geste-à-peau (gesto na pele). Em um terceiro tempo, […] anos depois, pude mensurar o que esse ato de interpretação havia transformado em mim. […] A palavra alemã ‘Gestapo’, por meio de um gesto no corpo, passou para a língua francesa. Um ato de tradução. A doçura desse gesto adoçou minha recusa dessa língua. Esse gesto também fazia um corte, uma refenda ali onde o sujeito é sua própria divisão. Ali onde ele está o mais próximo do real. Havia um antes e um depois”[37].

O acontecimento analista aqui, nesse depoimento de Susanne Hommel, faz par com a urgência do tempo de onde não se sai: o tempo do real! Miller irá dizer que “Uma interpretação sempre quer dizer ‘você leu mal o que estava escrito’. […] A interpretação supõe que a própria fala seja uma leitura, que ela reconduza a fala ao ‘texto original’”[38]. E da origem o que temos é o furo, o furo do umbigo, a fenda do real que ressona como um sopro desse exílio, “quando o esp de um laps […] já não tem mais nenhum impacto de sentido (ou interpretação), só então temos a certeza de estar no inconsciente […] digo: o inconsciente, ou seja, o real”[39].

Lacan, tal como o lê Éric Laurent, nos leva “à passagem entre o inconsciente eternidade ligado à morte e o inconsciente instante próprio ao vivente”[40]. Desde o início de seu ensino, ele persegue o instante em que a porta se abre, o relâmpago que tudo muda e subverte ao ler o mesmo de uma outra maneira, uma nova amarração. Lacan corta e costura e faz da experiência analítica uma prática topológica orientada ao real, fenda aberta ao indeterminado, à espreita dessa bela inapreensível, fora do sentido, com sua potência subversiva. Se para Freud o inconsciente é Roma, a cidade eterna, para Lacan, o inconsciente acontece num instante em Baltimore ao amanhecer.

 

O tempo da escolha: o indeterminado que subverte

Portanto, quando Romildo do Rêgo Barros, diretor da EBP, enunciou o título do XXIV Encontro Brasileiro do Campo Freudiano – Analista: presente! –, tal convite se desdobra em dois caminhos enodados sob um mesmo giro: se, por um lado, evoca o analista presente na experiência analítica, por outro lado também faz par com a época e evoca a presença da psicanálise na cidade. Podemos ler aí um convite para que os diversos colegas analistas da EBP extraiam da sua experiência uma lupa para ler o grão de real alojado no laço inexorável do discurso analítico com o sintoma social, e que se mostra presente na transversalidade pulsante dos debates que se impõem na pauta do dia como questões de Sociedade e que, consequentemente, ressoam na atualidade da clínica, desdobrando-se em questões de Escola.

O analista de orientação lacaniana não é indiferente ao espírito do seu tempo, à subjetividade da sua época, ao que repercute no sinthoma de cada um. Hoje, o sonho democrático encontra-se ameaçado em diversos sítios do planeta. A guerra contra a Ucrânia configura-se “uma das grandes tragédias históricas deste século, que já vem se mostrando como um século da anti-democracia”[41]. Discursos totalitários brotam em campos supostamente democráticos, cujo efeito, como dissera Lacan, tem sido “a segregação trazida à ordem do dia por uma subversão sem precedentes”[42]. No Brasil, estamos em um momento decisivo, cuja urgência diz respeito ao risco eminente de o fascismo aqui se instalar. E isso nos diz respeito, pois “não há escola sem fazer escolhas, não há escola sem partido, sem tomar partido anti-fascista”[43]. Não existe psicanálise sem democracia, portanto, estamos aí engajados, porque “a indiferença não se mantém um segundo na economia do discurso analítico, desde que há o desejo do analista”[44], enfatiza Miller em “Ponto de basta”. A experiência analítica nos ensina, tal como podemos ler nas vinhetas que trouxe aqui, que basta um instante para que uma subversão aconteça, mudando a direção dos ventos que sopram. É este o sentido da palavra augenblick[45].

“O instante é desse modo o presente que, de repente, ganha um sentido, é a própria existência, subitamente mobilizada, que se ilumina presentemente em suas possibilidades as mais próprias, tornando-se por isto e de alto a baixo, afrontamento ou resignação, resolução ou abandono, liberação ou servidão, diante da alternativa que a intima a decidir por si mesma escolhendo”[46].

Neste instante, o que está em jogo é um projeto de sociedade e a democracia, irredutivelmente, é a escolha analítica. Portanto, engajar-se nos debates em pauta, infiltrando ali o grão da diferença absoluta que não se deixa normatizar, concerne à ética da Psicanálise, em sua função compensatória, como pulmão artificial. Analista presente, então, brilha, mais ainda, como um respiradouro, face aos impasses crescentes da civilização, que hoje flerta com o extremismo genocida do pensamento único que atropela as soluções singulares, diversas e inéditas, como se fosse possível tudo determinar. Contudo, a matéria que orienta a nossa prática é o gozo, cujo real dissolve toda pretensão de encerrar o que quer que seja em uma última palavra.

Comecemos, então, por perguntar sobre a forma como a existência e o impossível se enlaçam e perfuram o espírito da época. Afinal, a experiência analítica vocifera: o ser sexuado só se autoriza de si mesmo e de mais alguns outros[47], e o analista, também! A Escola é uma comunidade dos que não fazem comunidade; a lógica da segregação é a coletiva; a psicologia individual é a social. Como a psicanálise faz par com a urgência de nossa época? Como furar a muralha da segregação, da homofobia, enfim, do racismo “com mais costuras do que cortes que permitam a circulação de novas palavras, de tribos diversas, enlaçados de um novo modo na Babel da nossa época?”[48]. A comunidade da EBP, pela singularidade que lhe causa, não é indiferente às consequências do racismo estrutural enraizado no Brasil, tal como podemos ler na última edição de Correio Express, com Marcus André:

“(…) o genocídio negro define-se por um jogo em que estamos todos envolvidos. Não é o racismo individual, que tanto causa polêmicas e pedidos de prisão, nem mesmo o institucional, o de uma empresa, que se resolve com uma política de cotas. É o racismo de toda uma sociedade que envolve cada um de seu lugar próprio. E talvez haja uma contribuição própria de Lacan ao debate. É que na clínica psicanalítica o termo “estrutural” só existe para localizar de que modo o sujeito pode ser chamado a participar da subversão dessa estrutura”[49].

Sim, é esta a aposta, pois não existe uma concatenação determinada e o indeterminado guarda uma subversão possível, um corte que inaugura um novo modo de ler, de fazer, de saber e de viver. Um novo laço social pode advir num instante aberto à não relação entre dois pontos. O XXIV Encontro Brasileiro do Campo Freudiano é um convite a investigar a relação e a não relação entre a consistência e inconsistência, existência e ex-sistência, determinação e indeterminação, gozo e ausência, materialidade e furo, corte e costura, o impossível e o laço, na atualidade da experiência analítica, onde no vivo de cada caso participa o vivo da época, a partir de três eixos de investigação:

I – O analista presente no espaço de um lapso?

II – O tempo, o corte e o ato: o acontecimento analista.

III – O impossível e o laço: o analista e a época.

A responsabilidade do analista aí se desdobra, como analista e como cidadão, para perfurar o totalitarismo que vier se apresentar em qualquer dimensão, na clínica ou na política, visando entre dois pontos, a abertura que dá passagem a um respiro.

De repente, eu realizo o fato de sua presença no que se passa, se perde, se transforma. O insondável, o incabível, o irredutível se faz intruso e, num claro instante, esclarece que há um infinito que sopra da junção mais íntima de um laço a dois.

Faz escuro, mas eu canto…[50]

Analista: presente!

Aguardamos os desdobramentos da nossa aposta no indeterminado que subverte, onde quer que esteja presente a experiência analítica da EBP.

 

Fernanda Otoni Brisset
Coordenadora da Comissão Científica do XXIV Encontro Brasileiro

 

 

[1] N.E.: Texto apresentado pela autora no dia 5 de maio de 2022, na atividade de lançamento do XXIV Encontro Brasileiro do Campo Freudiano “Analista: Presente!”.

[2] BARROS, R. R. “Analista: Presente! (em circunstâncias e tempos diversos)”. Punctum, n. 0. Disponível em: http://encontrobrasileiroebp2022.com.br/analista-presente-em-circunstancias-e-tempos-diversos/

[3] Intervenção de Christiane Alberti, Presidente da Associação Mundial de Psicanálise, na Assembleia Geral da Escola Brasileira de Psicanálise, em 30 de abril de 2022.

[4] RUBIÃO, L. “Analista: presente!”. Punctum, n. 0. Disponível em: http://encontrobrasileiroebp2022.com.br/analista-presente/

[5] AGAMBEN, G. “A imanência absoluta”. In: ALLIEZ, E. Gilles Deleuze: uma vida filosófica. Rio de Janeiro: Editora 34, 2000. p. 171.

[6] Ibidem.

[7] Ibidem.

[8] Ditmension é um neologismo usado por Lacan e traduzido por Sérgio Laia em português como dizmensão. Em 1976, por ocasião da última lição do Seminário O sinthoma, Lacan esclarece que esse neologismo, por sua homofonia, faz-se ler de uma outra maneira: “Dizmensão é mensão do dito. Essa maneira de escrever tem uma vantagem: permite prolongar mensão [mention] em mentira [mensonge], indicando que o dito não é de modo algum forçosamente verdadeiro.” Cf. LACAN, J. O seminário, livro 23: O Sinthoma. (1975-1976) Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2007. p. 141.

[9] AGAMBEN, G. 2000, op. cit., p. 173. O autor conversa, aqui, com a Gramática de Dionísio Trácio e com os primeiros tratados de pontuação. Cf. MASMEJAN, J. H. Traité de la ponctuation. Paris: I-F. Bastien, 1781.

[10] LAURENT, É. “A interpretação: da escuta ao Escrito”. Correio, São Paulo, n. 87, p. 37, 2022.

[11] Agradeço a Andrea Orabona a gentileza dessa referência, em momento tão oportuno.

[12] MILLER, J.-A.; ALBERTI, C. (Dir.) Ornicar?, Lacan Redivivus, Paris: Navarin éditeur, 2021. Texto de contracapa. Tradução nossa.

[13] LACAN, J. O seminário, livro 20: Mais, ainda. (1972-1973) Texto estabelecido por Jacques-Alain Miller. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 1985, p. 39.

[14] FREUD, S. “Construções na análise”. (1937) In: FREUD, S. Fundamentos da clínica psicanalítica. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2017. p. 345. (Obras incompletas de Sigmund Freud)

[15] LACAN, J. O seminário, livro 1: Os escritos técnicos de Freud. (1953-1954) Texto estabelecido por Jacques-Alain Miller. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 1986. p. 52. Grifo do autor.

[16] LACAN, J. “Posição do inconsciente”. In: LACAN, J. Escritos. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 1998. p. 848.

[17] Marcela Antelo escreveu sobre esse livro, de Sacha Nacht, no artigo “A sessão obsoleta”, publicado em Opção Lacaniana, São Paulo, Ed. Eolia, n. 30, p. 55, 2001.

[18] LACAN, J. O seminário, livro 11: Os quatro conceitos fundamentais da psicanálise. (1964) Texto estabelecido por Jacques-Alain Miller. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 1988. p. 121.

[19] MAHJOUB, L. “Le tourbillon de la vie”. In: MILLER, J.-A.; ALBERTI, C. (Dir.). Ornicar?, Lacan Redivivus. Paris: Navarin éditeur, 2021. p. 359. Tradução nossa.

[20] MAHJOUB, L. « …s’aille à mourre ». La Règle du Jeu, n. 75, 2011. Tradução nossa. Disponível em: https://laregledujeu.org/2011/10/12/7330/s-aile-a-mourre%c2%a0/

[21] LACAN, J. 1988, op. cit., p. 125-126.

[22] LAURENT, É. 2022, op. cit., p. 66.

[23] MILLER, J.-A. “O monólogo da aparola”. Opção Lacaniana online, nova série, São Paulo, ano 3, n. 9, nov. 2012.

[24] Ibidem.

[25] MILLER, J.-A. A erótica do tempo. Rio de Janeiro: EBP, 2000. p. 52.

[26] MILLER, J.-A. “L’interprétation à l’envers”. La Cause freudienne, Paris, n. 32, p. 13, jan. 1996.

[27] Neologismo criado por Jacques Lacan reunindo na palavra moterialité os vocábulos mot (palavra) e matérialité (materialidade).

[28] MILLER, J.-A. « Os Troumains ». Lição de 2 de maio de 2007 do curso de J.-A. Miller A orientação lacaniana. O ultimíssimo Lacan (2006-2007). Versão estabelecida por Pascale Fari e traduzida em português por Vera Avellar Ribeiro. Disponível em: https://congresoamp2020.com/pt/articulos.php?sec=el-tema&sub=textos-de-orientacion&file=el-tema/textos-de-orientacion/20-03-02_los-trumanos.html

[29] LACAN, J. La troisième. Paris: Navarin éditeur, 2021. p. 17.

[30] LACAN, J. “Rumo a um significante novo”. Opção Lacaniana, São Paulo, Ed. Eolia, n. 22, p. 10, ago. 1998.

[31] LAURENT, É. “Apprendre à lire, ou le trajet d’une letter”. In: MILLER, J.-A.; ALBERTI, C. (Dir.) Ornicar?, Lacan Redivivus. Paris: Navarin éditeur, 2021. p. 367. Tradução nossa.

[32] LAURENT, É. 2022, op. cit., p. 73.

[33] LACAN, J. 1985, op. cit., p. 49.

[34] Ibidem, p. 47.

[35] Ibidem, p. 51.

[36] Éric Laurent, desdobra o alcance de tal interpretação: “A problemática da interpretação assemântica introduz uma dimensão híbrida entre o significante e a letra, ao passo que toda uma parte do ensino de Lacan os opõe. Ela dá conta do fato de que Lacan vem a opor a interpretação e a fala. ‘A interpretação analítica […] incide de uma forma que vai muito mais longe do que a fala. A fala é um objeto de elaboração para o analisando, mas o que acontece com os efeitos do que diz o analista – porque ele diz –, não é trivial formular que a transferência desempenha nisso um papel, mas isso não esclarece nada. Tratar-se-ia de explicar como a interpretação incide e que ela não implica necessariamente uma enunciação’”. Em: LAURENT, É. 2022, p. 65-66.

[37] HOMMEL, S. Uma história de família no tempo do nazismo. Correio, São Paulo, n. 87, p. 31-32, 2022.

[38] MILLER, J.-A. 2000, op. cit., p. 54.

[39] LACAN, J. “Prefácio à edição inglesa do Seminário 11”. (1976) In: LACAN, J. Outros escritos. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2003. p. 567.

[40] LAURENT, É. 2021, op. cit., p. 366.

[41] AVRITZER, L. “Guerra, democracia e soberania. A terra é redonda”. 5 mar. 2022. Disponível em: https://aterraeredonda.com.br/guerra-democracia-e-soberania/?doing_wp_cron=1650251667.0410819053649902343750.

[42] LACAN, J. Petit discours aux psychiatres de Sainte-Anne. (1967) Disponível em: http://ecole-lacanienne.net/wp-content/uploads/2016/04/1967-11-10.pdf. Acesso em: 3 ago. 2017.

[43] Comentário de Maria do Rosário do Rêgo Barros, na Assembleia Geral da EBP, em 30 de abril de 2022

[44] MILLER, J.-A. “Ponto de basta”. Opção Lacaniana, São Paulo, Ed. Eolia, n. 79, p. 30, 2018.

[45] Augenblick é o termo usado por Heidegger para se referir a o instante. Em Miller (2018, op. cit., p. 26), lemos como Beaufret realiza a preciosa tradução desse termo em francês, observando o sentido antigo das palavras: “a melhor tradução do alemão Augenblick seria, em francês, choix (escolha), pois o sentido antigo de choisir (escolher) é voir (ver)”.

[46] BEAUFRET, J. De l’existentialisme à Heidegger. Introduction aux philosophies et autres textes. Paris: Vrin, 2000. p. 58 apud MILLER, 2018, op. cit., p. 26.

[47] LACAN, J. Le séminaire, livre XXI: Les non-dupes errent. 1974. Inédito.

[48] Mensagem que me foi enviada por Margarida Assad e que orientou com precisão a questão.

[49] VIEIRA, M. A. “Meus dias de branco”. Correio Express, 18 abr. 2022. Disponível em: https://www.ebp.org.br/correio_express/2022/04/18/meus-dias-de-branco1/

[50] MELLO, T. Faz escuro mas eu canto. São Paulo: Global Editora, 2017.

Analista: presente! Tal frase surgiu a Romildo do Rêgo Barros como um sopro, num instante. Pareceu-lhe poético, estético, um grão a perseguir. Ao me convidar para coordenar a Comissão Científica, disse: “Já tenho o título e se escreve assim: Analista dois-pontos presente ponto de exclamação”. Um título para ser lido: da fala ao escrito. E acrescentou: “É só isto o que tenho. Temos pela frente a tarefa de desdobrá-lo e extrair dele algum ensino”.

Sobre o “desdobrar”, Romildo escreveu:

“O analista, como a mulher, é desdobrável, e isto tem consequências. A primeira delas é que ele, assim como ocorre quando recebe uma demanda de análise, não sabe de antemão o que vai acontecer, e menos ainda quando lança mão do seu computador ou do seu telefone, suplementares do antigo setting […].

Só o tempo dirá com maior clareza os efeitos e o sentido desse acréscimo e desse gesto inédito […]. Uma coisa pelo menos é certa: após essa experiência, nós nos tornamos sem dúvida mais sensíveis à contingência, longe do dogmatismo […]”[2].

No desdobrar, uma aposta na abertura ao indeterminado, na contingência que fura o dogmatismo por um gesto inédito. Punctum!, nome do nosso boletim on-line! Nosso encontro acontece no instante punctum da história da psicanálise, quando em resposta à pandemia, a experiência de uma prática on-line aconteceu de forma inédita. “Analista: presente!” faz par com esta novidade, e, como disse Christiane Alberti, “não para denegri-la ou celebrá-la, mas tomando-a como um vetor de nossa investigação”[3].

Ao cair na rede, o “Analista: presente!” logo se desdobrou, dirigindo-se a um S2: “presença do analista”. Mas haveria uma identidade entre os termos? Para Laura Rubião, “Analista: presente!” “transmite, necessariamente, por sua escrita singular, um curioso enodamento entre o que se diz e o que se escreve. Dois pontos, pausa, detenção. Na sequência, o que se enuncia sob o modo exclamativo – presente! – […]”[4].

 

Entre dois pontos

Dois-pontos é um elemento linguístico sem sentido, assemântico, que se intromete entre o analista e o presente. Esse elemento tem um valor de pausa, e eu acrescentaria que instala entre o semântico e o assemântico uma conjunção indeterminada. Entre o analista e o presente não há uma conexão lógica direta, requer-se uma passagem. Sem os dois-pontos e a exclamação, “analista presente” é só um sintagma onde um substantivo se liga ao adjetivo, estabelecendo uma identidade entre os termos: S1-S2.

Mas, pausa lá! Tem dois-pontos no meio do caminho.

Graças a um cochicho de Flávia Cêra, pude ler alhures, em Giorgio Agamben, que o sinal de dois-pontos, numa frase, “[…] inclui também a ‘não-relação’ ou a relação que deriva da não-relação […]”[5]. Ele retoma a metáfora de Adorno, que evoca os dois-pontos como o sinal verde no trânsito da linguagem, bem como os tratados sobre a pontuação, onde se lê que os dois-pontos também ali são classificados “entre os sinais que abrem”[6]. Então, seguindo essa trilha aberta por Agamben, talvez seja possível dizer que também entre Analista e presente haja “uma espécie de passagem sem distância e identificação – algo como uma passagem sem mudança espacial”[7]. Presumo que esse sinal assemântico abre a outra dizmensão (ditmension[8]), tal como escreveu Lacan.  “Que na pontuação esteja presente um elemento assintático e, mais em geral, assemântico, está implícito na conexão constante, com o respiro […] e que age necessariamente como uma interrupção do sentido […] indica onde se deve respirar”[9].

A poética do título assim se desdobra. Sigo com Éric Laurent: Se “Lacan evoca a insistência da carta poética em infringir as regularidades sintáticas”, é porque “há na letra uma insistência de violação. O que interessa a Lacan é a escrita poética como ilha de efração, de irregularidade”[10]. Uma pausa para respirar, corte que abre passagem a uma outra dizmensão, indeterminada, mas que pode acontecer – a poética do título se mostra então como um achado e um tropeço, suporte e vertigem da causa que desagua numa experiência de análise e em cada época.

Falar do argumento e dos eixos de nosso trabalho foi a tarefa que a coordenação do Encontro me incumbiu, hoje, mas me vi num impasse: como apresentar o argumento, uma vez que ele já caiu nas redes? Mesmo que muitos ainda não o tenham lido, como apresentar o mesmo de uma outra maneira?

Ouvi[11] sobre uma conferência onde Esthela Solano contava sua análise com Lacan e fui dormir. O título da Ornicar? especial: Lacan Redivivus! me despertou e eu, nele, ouvia: Lacan: presente! Uma edição fora de série, “sem exegeses eruditas da doutrina, um livro dedicado a torná-lo vivo”[12]. Folheei esse objeto precioso. Li o que ali escreveram aqueles que se analisaram com Lacan, o efeito de real do encontro com um analista: presente!

O frescor do redivivus se fez presente, e eu o segui…

 

Entre a eternidade e o instante

Chama a atenção como nos testemunhos dos analisantes de Lacan, o analista, em ato, corta a rotina como um objeto sonante, perturbador, acolhedor, nunca o mesmo, no par e passo da pulsação temporal que escande o dizer. A presença do gesto, da modulação da voz, seu tom, sua ternura, sua cólera, seu cinismo, seu silêncio participam do tecido de um laço a dois e, mais ainda, de uma subversão. Lemos em cada relato dos analisantes um Lacan diferente, presente em cada um como em nenhum outro, o que ilustra muito bem que, no discurso analítico, “só se trata disto, do que se lê e tomando como o que se lê para além do que vocês incitaram o sujeito a dizer”[13]. O que nos leva a investigar o estatuto do inconsciente e da interpretação na atualidade na clínica.

De Freud a Lacan, onde estamos?

Para Freud, o inconsciente é uma cidade eterna. E o analista, na analogia freudiana, se aproximaria do arqueólogo em sua função de escavar os escombros[14] e interpretar seus resíduos para ler os capítulos apagados da história, devolvendo-lhe um lugar na rede dos sentidos. Mas, tomada no giro da dinâmica da transferência, a presença do analista pode vir a surgir como um obstáculo, fechando a porta do inconsciente.

Lacan, em 1953, lê essa dificuldade apontada por Freud assim: “No momento em que ele [o paciente] parece pronto para formular alguma coisa de mais autêntico, de mais quente do que jamais pôde atingir até então, o sujeito, em certos casos, se interrompe e emite um enunciado que pode ser este: Eu realizo de repente o fato da sua presença[15]. Ou seja, antes da porta se fechar, algo ali irrompe e se precipita na presença do analista. Aproximação e tropeço! Lacan segue perseguindo esse impossível de apreender que a presença do analista evoca, construindo formas para sondá-lo e dele se servir na direção da clínica.

Em “Posição do inconsciente” (1960), Lacan diz que o analista faz “parte do conceito do inconsciente, posto que constitui seu destinatário” e que ele só sustentaria a presença do inconsciente ao “experimentar-se sujeitado à fenda do significante”[16]. Ou seja, a parte destinada ao analista no inconsciente é a que se abisma na fenda do Outro, no furo do significante, uma formulação que parece auspiciar o S de Ⱥ. Em 1964, em uma aula cujo título é a “presença do analista”, nome de um livro[17] fortemente criticado por Lacan, este diz que a expressão presença do analista era muito bela e seria um erro reduzi-la “a essa espécie de pregação lacrimejante, a essa intumescência cerosa, a essa carícia um pouco viscosa…” e afirma em seguida: “a presença do analista é ela própria uma manifestação do inconsciente”[18]. Lilia Mahjoub nos abre o alcance de tal bela expressão:

“[…] as sessões com ele não eram verdadeiramente curtas. Durante estas, ele se levantava, vinha me olhar enquanto eu estava deitada no divã, sorria para mim. Eu queria desaparecer. Eu fechava os olhos como o fazem as crianças que querem se esconder.[19]

É o início do verão, está fazendo muito calor naquele lugar habitualmente fresco que é o 5, rue de Lille. Glória me avisa que posso ir ao escritório de Lacan onde ele me espera. Aninhado em sua poltrona, atrás do divã, ele gesticula para que eu me deite com um ‘Ah, querida, venha’. Acho seus trajes um tanto negligenciados, sua camisa aberta deixando aparecer sua barriga. Fico em silêncio este dia. Ele também. Na sessão seguinte, digo a ele: ‘A última vez, o senhor tinha a sua camisa aberta’. E ele me solta em tom suave: ‘O que eu tinha de aberto?’”[20].

 

Interpretação que descortina o que em si insistia como olhar na cena de sua fantasia. Esta vinheta esclarece que o inconsciente que se abre ali, por um instante, já não é mais o freudiano, e sim aquele que acontece lá onde o analista é sujeitado à fenda que abre… e Lacan fará um percurso até o final do seu ensino para o bem dizer. Ele parece estar no seu encalço.

Ainda, no Seminário 11, ele dirá ser justo o bom senso – aquele do sentido, “que fecha a porta, ou a janela, ou o postigo”, do inconsciente. E “a bela com quem queremos falar está lá detrás”, pedindo para reabrir os postigos. “E por isso mesmo [diz Lacan] que é neste momento que a interpretação se torna decisiva, pois é à bela que temos que nos dirigir”. Para ele, o inconsciente, que se trata de realizar, “ele não está do lado de lá do fechamento, ele está do lado de fora. É ele que, pela boca do analista, apela à reabertura do postigo”. A bela lá fora, surge na boca do analista… se intromete nesta fenda. Impossível de apreender, ela está sempre lá, presente, “em toda abertura, por mais fugidia que seja, do inconsciente”[21].

Se, “no primeiro ensino de Lacan, a interpretação tinha como efeito dar acesso aos capítulos apagados da história, ao que ali estava escrito”, nos escombros da cidade eterna, Lacan segue em seu ensino e “se livra dessa referência à história”[22] lacrimejante, cerosa, viscosa da associação sem fim, através da interpretação que se dirige à bela que passa e não se deixa capturar pela rede dos sentidos.

Esthela Solano conta em seu livro Três segundos com Lacan que, antes de ir ver Lacan, fez uma análise em que as sessões duravam 45 minutos. Ali ela falava, fumava e chorava o tempo todo. Com Lacan, suas sessões eram curtíssimas e as interpretações sem nenhum sentido. Ela não entendia nada, mas furavam a couraça de sentido que tecera na análise anterior. Um dia, ele corta o que ela estava a dizer numa sessão que dura exatos três segundos. Ao atravessar o pátio, ouve o equívoco que o corte evidenciava, e ela ri pela primeira vez, depois de tanto chorar. Para que gastar 45 minutos para chorar quando bastam três segundos para sorrir? O corte desprega o S2 do S1, algo do gozo se libera desse Um que se lê, agora, de outra maneira e a faz sorrir. Tal como precisa Miller, “é preciso que haja um limite ao monólogo autista do gozo. […] – A interpretação analítica faz limite[23]. O analista aí presente é o corte que rompe “na contramão do princípio do prazer […] introduz o impossível”[24]. Uma vinheta que mostra que cada sessão é única e instala o tempo como analista[25], a perfurar o inconsciente repetição para dar lugar ao fulgor do inconsciente intérprete. Esthela Solano seguiu sua análise numa outra posição, sem choro, e os cortes rápidos continuariam até o final.

“A questão não é saber se a sessão é longa ou curta, silenciosa ou falante. Ou a sessão é uma unidade semântica, aquela em que S2 vem pontuar a elaboração – delírio a serviço do Nome-do-Pai, muitas sessões são assim, ou então a sessão analítica é uma unidade assemântica, reconduzindo o sujeito à opacidade de seu gozo. Isso supõe que, antes de ser concluída, ela seja cortada”[26].

No caso de Esthela Solano e Lilia Mahjoub, o analista perturba a defesa, perfura sua ficção numa ajuda-contra para fazer percutir a moterialité[27] que faz vibrar o real no dizer. Uma aposta na potência de subversão. Dito de outro modo, o “analisante fala, o analista corta. Não é mais a palavra que faz a coisa, mas o corte que tem o poder de mudar a estrutura das coisas”[28]. O real que não é o mundo, uma vez que “não há nenhuma esperança de alcançar o real pela representação”[29] e o simbólico só pode mentir. Então, só temos o corpo como suporte, não há outro, para vibrar e repercutir o que é da existência. Lacan explora os recursos que permitem ao analista alçar a fenda e fazer vibrar o furo em S de Ⱥ, pois “o forçamento é por onde um psicanalista pode fazer soar outra coisa que não o sentido”[30]:

“[…] depois de longos anos e no meio de desavenças fantasmáticas variadas, eu estaciono um dia meu carro […] em um quarteirão da rue de Lille. Eu abro minha porta e um outro carro adentra no meu. […] eu me precipito à sessão para fazer uma descrição exaltada do acontecimento. Eu o lia como um ato falho que poderia ter tido uma incidência catastrófica. Eu vibrava com as ressonâncias do que poderia ter acontecido. E então, [Lacan] soltou um ‘em suma, isso aí não tem nenhuma importância’. Esta interpretação soou como um: ‘c’est fini’. Era o tempo de despertar dos encantamentos da leitura de todos esses signos. Eu estava confrontado com uma outra espécie de buraco, uma espécie de travessia do deserto, até a saída final”[31].

Éric Laurent evoca o instante em que o falasser se depara com o seu exílio da relação que não existe. “Quando atingimos esse ponto, essa ausência do eu (moi)” é onde algo de novo acontece. Lacan sustenta que só aí “estamos no registro do discurso analítico”[32]. Ele verifica a fenda, onde a barra tomba sobre o A, o que instala uma passagem a uma outra dizmensão: da fala ao escrito. Pois, “tudo o que é escrito parte do fato de que será para sempre impossível escrever como tal a relação sexual”[33]. É a este impossível que a interpretação se dirige, a bela com quem se quer conversar. E o que por esta via se abre “não tem a ver com os ouvidos, mas somente com a leitura, com a leitura do que se ouve”[34], pois se o inconsciente é o que se lê, “o que há de mais próximo daquilo que nós analistas, graças ao discurso analítico, temos de ler – é o lapso”[35]. Isso nos abre à problemática da interpretação corte, assemântica e apofântica[36], quando se alcança uma outra dizmensão:

“Em uma sessão, digo: ‘Acordo todas as manhãs às 5 horas. É a hora em que a Gestapo vem procurar os judeus em suas casas…’ Lacan se levanta, se precipita até mim e acaricia minha bochecha esquerda. E corta a sessão. Num primeiro tempo, fiquei siderada, emocionada. Num segundo tempo, decompus a palavra: geste-à-peau (gesto na pele). Em um terceiro tempo, […] anos depois, pude mensurar o que esse ato de interpretação havia transformado em mim. […] A palavra alemã ‘Gestapo’, por meio de um gesto no corpo, passou para a língua francesa. Um ato de tradução. A doçura desse gesto adoçou minha recusa dessa língua. Esse gesto também fazia um corte, uma refenda ali onde o sujeito é sua própria divisão. Ali onde ele está o mais próximo do real. Havia um antes e um depois”[37].

O acontecimento analista aqui, nesse depoimento de Susanne Hommel, faz par com a urgência do tempo de onde não se sai: o tempo do real! Miller irá dizer que “Uma interpretação sempre quer dizer ‘você leu mal o que estava escrito’. […] A interpretação supõe que a própria fala seja uma leitura, que ela reconduza a fala ao ‘texto original’”[38]. E da origem o que temos é o furo, o furo do umbigo, a fenda do real que ressona como um sopro desse exílio, “quando o esp de um laps […] já não tem mais nenhum impacto de sentido (ou interpretação), só então temos a certeza de estar no inconsciente […] digo: o inconsciente, ou seja, o real”[39].

Lacan, tal como o lê Éric Laurent, nos leva “à passagem entre o inconsciente eternidade ligado à morte e o inconsciente instante próprio ao vivente”[40]. Desde o início de seu ensino, ele persegue o instante em que a porta se abre, o relâmpago que tudo muda e subverte ao ler o mesmo de uma outra maneira, uma nova amarração. Lacan corta e costura e faz da experiência analítica uma prática topológica orientada ao real, fenda aberta ao indeterminado, à espreita dessa bela inapreensível, fora do sentido, com sua potência subversiva. Se para Freud o inconsciente é Roma, a cidade eterna, para Lacan, o inconsciente acontece num instante em Baltimore ao amanhecer.

 

O tempo da escolha: o indeterminado que subverte

Portanto, quando Romildo do Rêgo Barros, diretor da EBP, enunciou o título do XXIV Encontro Brasileiro do Campo Freudiano – Analista: presente! –, tal convite se desdobra em dois caminhos enodados sob um mesmo giro: se, por um lado, evoca o analista presente na experiência analítica, por outro lado também faz par com a época e evoca a presença da psicanálise na cidade. Podemos ler aí um convite para que os diversos colegas analistas da EBP extraiam da sua experiência uma lupa para ler o grão de real alojado no laço inexorável do discurso analítico com o sintoma social, e que se mostra presente na transversalidade pulsante dos debates que se impõem na pauta do dia como questões de Sociedade e que, consequentemente, ressoam na atualidade da clínica, desdobrando-se em questões de Escola.

O analista de orientação lacaniana não é indiferente ao espírito do seu tempo, à subjetividade da sua época, ao que repercute no sinthoma de cada um. Hoje, o sonho democrático encontra-se ameaçado em diversos sítios do planeta. A guerra contra a Ucrânia configura-se “uma das grandes tragédias históricas deste século, que já vem se mostrando como um século da anti-democracia”[41]. Discursos totalitários brotam em campos supostamente democráticos, cujo efeito, como dissera Lacan, tem sido “a segregação trazida à ordem do dia por uma subversão sem precedentes”[42]. No Brasil, estamos em um momento decisivo, cuja urgência diz respeito ao risco eminente de o fascismo aqui se instalar. E isso nos diz respeito, pois “não há escola sem fazer escolhas, não há escola sem partido, sem tomar partido anti-fascista”[43]. Não existe psicanálise sem democracia, portanto, estamos aí engajados, porque “a indiferença não se mantém um segundo na economia do discurso analítico, desde que há o desejo do analista”[44], enfatiza Miller em “Ponto de basta”. A experiência analítica nos ensina, tal como podemos ler nas vinhetas que trouxe aqui, que basta um instante para que uma subversão aconteça, mudando a direção dos ventos que sopram. É este o sentido da palavra augenblick[45].

“O instante é desse modo o presente que, de repente, ganha um sentido, é a própria existência, subitamente mobilizada, que se ilumina presentemente em suas possibilidades as mais próprias, tornando-se por isto e de alto a baixo, afrontamento ou resignação, resolução ou abandono, liberação ou servidão, diante da alternativa que a intima a decidir por si mesma escolhendo”[46].

Neste instante, o que está em jogo é um projeto de sociedade e a democracia, irredutivelmente, é a escolha analítica. Portanto, engajar-se nos debates em pauta, infiltrando ali o grão da diferença absoluta que não se deixa normatizar, concerne à ética da Psicanálise, em sua função compensatória, como pulmão artificial. Analista presente, então, brilha, mais ainda, como um respiradouro, face aos impasses crescentes da civilização, que hoje flerta com o extremismo genocida do pensamento único que atropela as soluções singulares, diversas e inéditas, como se fosse possível tudo determinar. Contudo, a matéria que orienta a nossa prática é o gozo, cujo real dissolve toda pretensão de encerrar o que quer que seja em uma última palavra.

Comecemos, então, por perguntar sobre a forma como a existência e o impossível se enlaçam e perfuram o espírito da época. Afinal, a experiência analítica vocifera: o ser sexuado só se autoriza de si mesmo e de mais alguns outros[47], e o analista, também! A Escola é uma comunidade dos que não fazem comunidade; a lógica da segregação é a coletiva; a psicologia individual é a social. Como a psicanálise faz par com a urgência de nossa época? Como furar a muralha da segregação, da homofobia, enfim, do racismo “com mais costuras do que cortes que permitam a circulação de novas palavras, de tribos diversas, enlaçados de um novo modo na Babel da nossa época?”[48]. A comunidade da EBP, pela singularidade que lhe causa, não é indiferente às consequências do racismo estrutural enraizado no Brasil, tal como podemos ler na última edição de Correio Express, com Marcus André:

“(…) o genocídio negro define-se por um jogo em que estamos todos envolvidos. Não é o racismo individual, que tanto causa polêmicas e pedidos de prisão, nem mesmo o institucional, o de uma empresa, que se resolve com uma política de cotas. É o racismo de toda uma sociedade que envolve cada um de seu lugar próprio. E talvez haja uma contribuição própria de Lacan ao debate. É que na clínica psicanalítica o termo “estrutural” só existe para localizar de que modo o sujeito pode ser chamado a participar da subversão dessa estrutura”[49].

Sim, é esta a aposta, pois não existe uma concatenação determinada e o indeterminado guarda uma subversão possível, um corte que inaugura um novo modo de ler, de fazer, de saber e de viver. Um novo laço social pode advir num instante aberto à não relação entre dois pontos. O XXIV Encontro Brasileiro do Campo Freudiano é um convite a investigar a relação e a não relação entre a consistência e inconsistência, existência e ex-sistência, determinação e indeterminação, gozo e ausência, materialidade e furo, corte e costura, o impossível e o laço, na atualidade da experiência analítica, onde no vivo de cada caso participa o vivo da época, a partir de três eixos de investigação:

I – O analista presente no espaço de um lapso?

II – O tempo, o corte e o ato: o acontecimento analista.

III – O impossível e o laço: o analista e a época.

A responsabilidade do analista aí se desdobra, como analista e como cidadão, para perfurar o totalitarismo que vier se apresentar em qualquer dimensão, na clínica ou na política, visando entre dois pontos, a abertura que dá passagem a um respiro.

De repente, eu realizo o fato de sua presença no que se passa, se perde, se transforma. O insondável, o incabível, o irredutível se faz intruso e, num claro instante, esclarece que há um infinito que sopra da junção mais íntima de um laço a dois.

Faz escuro, mas eu canto…[50]

Analista: presente!

Aguardamos os desdobramentos da nossa aposta no indeterminado que subverte, onde quer que esteja presente a experiência analítica da EBP.

 

Fernanda Otoni Brisset
Coordenadora da Comissão Científica do XXIV Encontro Brasileiro

 

 

[1] N.E.: Texto apresentado pela autora no dia 5 de maio de 2022, na atividade de lançamento do XXIV Encontro Brasileiro do Campo Freudiano “Analista: Presente!”.

[2] BARROS, R. R. “Analista: Presente! (em circunstâncias e tempos diversos)”. Punctum, n. 0. Disponível em: http://encontrobrasileiroebp2022.com.br/analista-presente-em-circunstancias-e-tempos-diversos/

[3] Intervenção de Christiane Alberti, Presidente da Associação Mundial de Psicanálise, na Assembleia Geral da Escola Brasileira de Psicanálise, em 30 de abril de 2022.

[4] RUBIÃO, L. “Analista: presente!”. Punctum, n. 0. Disponível em: http://encontrobrasileiroebp2022.com.br/analista-presente/

[5] AGAMBEN, G. “A imanência absoluta”. In: ALLIEZ, E. Gilles Deleuze: uma vida filosófica. Rio de Janeiro: Editora 34, 2000. p. 171.

[6] Ibidem.

[7] Ibidem.

[8] Ditmension é um neologismo usado por Lacan e traduzido por Sérgio Laia em português como dizmensão. Em 1976, por ocasião da última lição do Seminário O sinthoma, Lacan esclarece que esse neologismo, por sua homofonia, faz-se ler de uma outra maneira: “Dizmensão é mensão do dito. Essa maneira de escrever tem uma vantagem: permite prolongar mensão [mention] em mentira [mensonge], indicando que o dito não é de modo algum forçosamente verdadeiro.” Cf. LACAN, J. O seminário, livro 23: O Sinthoma. (1975-1976) Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2007. p. 141.

[9] AGAMBEN, G. 2000, op. cit., p. 173. O autor conversa, aqui, com a Gramática de Dionísio Trácio e com os primeiros tratados de pontuação. Cf. MASMEJAN, J. H. Traité de la ponctuation. Paris: I-F. Bastien, 1781.

[10] LAURENT, É. “A interpretação: da escuta ao Escrito”. Correio, São Paulo, n. 87, p. 37, 2022.

[11] Agradeço a Andrea Orabona a gentileza dessa referência, em momento tão oportuno.

[12] MILLER, J.-A.; ALBERTI, C. (Dir.) Ornicar?, Lacan Redivivus, Paris: Navarin éditeur, 2021. Texto de contracapa. Tradução nossa.

[13] LACAN, J. O seminário, livro 20: Mais, ainda. (1972-1973) Texto estabelecido por Jacques-Alain Miller. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 1985, p. 39.

[14] FREUD, S. “Construções na análise”. (1937) In: FREUD, S. Fundamentos da clínica psicanalítica. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2017. p. 345. (Obras incompletas de Sigmund Freud)

[15] LACAN, J. O seminário, livro 1: Os escritos técnicos de Freud. (1953-1954) Texto estabelecido por Jacques-Alain Miller. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 1986. p. 52. Grifo do autor.

[16] LACAN, J. “Posição do inconsciente”. In: LACAN, J. Escritos. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 1998. p. 848.

[17] Marcela Antelo escreveu sobre esse livro, de Sacha Nacht, no artigo “A sessão obsoleta”, publicado em Opção Lacaniana, São Paulo, Ed. Eolia, n. 30, p. 55, 2001.

[18] LACAN, J. O seminário, livro 11: Os quatro conceitos fundamentais da psicanálise. (1964) Texto estabelecido por Jacques-Alain Miller. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 1988. p. 121.

[19] MAHJOUB, L. “Le tourbillon de la vie”. In: MILLER, J.-A.; ALBERTI, C. (Dir.). Ornicar?, Lacan Redivivus. Paris: Navarin éditeur, 2021. p. 359. Tradução nossa.

[20] MAHJOUB, L. « …s’aille à mourre ». La Règle du Jeu, n. 75, 2011. Tradução nossa. Disponível em: https://laregledujeu.org/2011/10/12/7330/s-aile-a-mourre%c2%a0/

[21] LACAN, J. 1988, op. cit., p. 125-126.

[22] LAURENT, É. 2022, op. cit., p. 66.

[23] MILLER, J.-A. “O monólogo da aparola”. Opção Lacaniana online, nova série, São Paulo, ano 3, n. 9, nov. 2012.

[24] Ibidem.

[25] MILLER, J.-A. A erótica do tempo. Rio de Janeiro: EBP, 2000. p. 52.

[26] MILLER, J.-A. “L’interprétation à l’envers”. La Cause freudienne, Paris, n. 32, p. 13, jan. 1996.

[27] Neologismo criado por Jacques Lacan reunindo na palavra moterialité os vocábulos mot (palavra) e matérialité (materialidade).

[28] MILLER, J.-A. « Os Troumains ». Lição de 2 de maio de 2007 do curso de J.-A. Miller A orientação lacaniana. O ultimíssimo Lacan (2006-2007). Versão estabelecida por Pascale Fari e traduzida em português por Vera Avellar Ribeiro. Disponível em: https://congresoamp2020.com/pt/articulos.php?sec=el-tema&sub=textos-de-orientacion&file=el-tema/textos-de-orientacion/20-03-02_los-trumanos.html

[29] LACAN, J. La troisième. Paris: Navarin éditeur, 2021. p. 17.

[30] LACAN, J. “Rumo a um significante novo”. Opção Lacaniana, São Paulo, Ed. Eolia, n. 22, p. 10, ago. 1998.

[31] LAURENT, É. “Apprendre à lire, ou le trajet d’une letter”. In: MILLER, J.-A.; ALBERTI, C. (Dir.) Ornicar?, Lacan Redivivus. Paris: Navarin éditeur, 2021. p. 367. Tradução nossa.

[32] LAURENT, É. 2022, op. cit., p. 73.

[33] LACAN, J. 1985, op. cit., p. 49.

[34] Ibidem, p. 47.

[35] Ibidem, p. 51.

[36] Éric Laurent, desdobra o alcance de tal interpretação: “A problemática da interpretação assemântica introduz uma dimensão híbrida entre o significante e a letra, ao passo que toda uma parte do ensino de Lacan os opõe. Ela dá conta do fato de que Lacan vem a opor a interpretação e a fala. ‘A interpretação analítica […] incide de uma forma que vai muito mais longe do que a fala. A fala é um objeto de elaboração para o analisando, mas o que acontece com os efeitos do que diz o analista – porque ele diz –, não é trivial formular que a transferência desempenha nisso um papel, mas isso não esclarece nada. Tratar-se-ia de explicar como a interpretação incide e que ela não implica necessariamente uma enunciação’”. Em: LAURENT, É. 2022, p. 65-66.

[37] HOMMEL, S. Uma história de família no tempo do nazismo. Correio, São Paulo, n. 87, p. 31-32, 2022.

[38] MILLER, J.-A. 2000, op. cit., p. 54.

[39] LACAN, J. “Prefácio à edição inglesa do Seminário 11”. (1976) In: LACAN, J. Outros escritos. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2003. p. 567.

[40] LAURENT, É. 2021, op. cit., p. 366.

[41] AVRITZER, L. “Guerra, democracia e soberania. A terra é redonda”. 5 mar. 2022. Disponível em: https://aterraeredonda.com.br/guerra-democracia-e-soberania/?doing_wp_cron=1650251667.0410819053649902343750.

[42] LACAN, J. Petit discours aux psychiatres de Sainte-Anne. (1967) Disponível em: http://ecole-lacanienne.net/wp-content/uploads/2016/04/1967-11-10.pdf. Acesso em: 3 ago. 2017.

[43] Comentário de Maria do Rosário do Rêgo Barros, na Assembleia Geral da EBP, em 30 de abril de 2022

[44] MILLER, J.-A. “Ponto de basta”. Opção Lacaniana, São Paulo, Ed. Eolia, n. 79, p. 30, 2018.

[45] Augenblick é o termo usado por Heidegger para se referir a o instante. Em Miller (2018, op. cit., p. 26), lemos como Beaufret realiza a preciosa tradução desse termo em francês, observando o sentido antigo das palavras: “a melhor tradução do alemão Augenblick seria, em francês, choix (escolha), pois o sentido antigo de choisir (escolher) é voir (ver)”.

[46] BEAUFRET, J. De l’existentialisme à Heidegger. Introduction aux philosophies et autres textes. Paris: Vrin, 2000. p. 58 apud MILLER, 2018, op. cit., p. 26.

[47] LACAN, J. Le séminaire, livre XXI: Les non-dupes errent. 1974. Inédito.

[48] Mensagem que me foi enviada por Margarida Assad e que orientou com precisão a questão.

[49] VIEIRA, M. A. “Meus dias de branco”. Correio Express, 18 abr. 2022. Disponível em: https://www.ebp.org.br/correio_express/2022/04/18/meus-dias-de-branco1/

[50] MELLO, T. Faz escuro mas eu canto. São Paulo: Global Editora, 2017.


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